domingo, 2 de janeiro de 2011

Relatos de Ferias

Episódio de hoje - Como cativar gatinhos (Agarre o seu!)



Prólogo

Acabo de sair do banheiro, nonde passara as últimas horas imitando o sono de um gato.



Capítulo I

Dia de natal, depois do almoço. Meu avô descançava (descançava de que?) numa rede conversando com minha mãe. Eu estava... sei lá, minha memória anda péssima, mas a usando probabilidade como critério, eu estava dormindo. Não. Lavando louça.
"Vitória, corre aqui!"
"Que foi?"
"Olha que fofo!"

De alguma forma um filhote de gato veio parar aqui no quintal. Bem, se fosse para chutar (o motivo, não o gato!), já que a força gravitacional é uma lei da natureza, seria plausível supor que gatos atraem gatos? Nós já tinhamos sete. Me pergunto em quanto tempo teríamos um buraco negro que mia.

Tenho que dizer, adoro gatos, então mesmo se aquele fosse muito feio, aquela barriguinha rosada me conquistaria. Precisava de um nome curto, fofinho e que terminasse em i. Caiti. Sagüi. Ií. Nao. Sarrus! Sim, o da regra. Sim, "termina" em i.

Sarrus, Sarrus
Não me deixa dormir.

"Não gato, eu não sou sua mamãe. Aliás não tenho teta. (Aliás tenho.) Pare, pelamordedeus, de me morder! E eu tenho cara de montanha para você ficar me escalando? Vá dormir lá fora." 
(Agora ele fica miando.)

Sarrus, Sarrus
Não me deixa dormir.


Capítulo II

Fomos informadas, cinco ou seis dias depois, que Sarrus tinha irmãos. Aimodios, onde? E chovia, sempre, como em todo verão ainda não atingido pelas tão tão anunciadas mudanças climáticas, nesse lugarzinho escondido no meio da soja. Enfim, tô viajando. (Literalmente, dependendo do ponto de vista.)

Voltas e voltas ao redor dos quarteirões com lanterna, ração e Meggie. Meggie pra que? Sei lá, ela segue a gente.


...

(Tô dando um tempo para você imaginar as cenas e sentir com mais profundidade a história. Não chore ainda.)

Hoje, voltando com minha mãe do mercado, resolvemos dar mais uma volta. Fareja, fareja, fareja, a-há! Três crianças negras, brincando em frente a uma casa abandonada. Desprezadas pelo mundo assim como milhões da nossa própria espécie.



Capítulo III


Na casa abandonada, onde antes funcionava um Posto de Saúde, fizeram de um cano sua toca. Impenetrável, para alguém do meu tamanho. O portão de trás (a casa tinha saída para duas ruas) estava escancarado. Minha estratégia (?) basearia-se nele. Hum, é claro, poderia também usar sua fome para manipulá-los! Brilhante! Inédito! Caberia mais sagacidade numa mente só?


Na verdade fiz só botar comida lá na frente, dar a volta e bloquear a entrada do cano com um tijolo. Foi puro acaso um deles ter se desesperado e tentado entrar lá a qualquer custo. A mente sagaz aqui catou o gato e pôs na caixa de transporte. Foi mordida até. E xingada, em miauês.

Os outros dispersaram. Minha mãe alertou que agora que haviam comido, ração não seria eficiente para distrai-los. Achei mais seguro devolver-lhes o abrigo e recuar. O destino do cativo foi o Centro de Reabilitação Felina da casa, vulgo banheiro do lado de fora.


Cerca de meia hora depois, com a caixa e uma porção de frango desfiado, parti para mais a execução de mais um plano infalível.

***
Inimigo à vista! TOQUE DE RECOLHER! Todos de volta à fortaleza!
(Juro que agora não queria fazer essa analogia, mas estou com preguiça então preparem-se para ler aquele episódio da mitologia grega tantas vezes recontado)

O inimigo movimenta-se. De onde foi que tiraram aquele gigante bizarro que nos ameaça? Não importa, não temos força para derrotá-lo. Na pior situação apenas poderemos fugir para as entranhas dessa nossa casa escura. (Foco no rosto dos personagens, música triste, oooô oooô) Alguns minutos se passam, cessam-se os sons exteriores. Estarão seguros agora? Há de se verificar. Uma orelha, outra orelha, focinho, pescoçinho esticado, passos miúdos. Repete-se a última frase. Dois soldados, valentes mas providos de débeis armaduras observam. Não é possível. Foram embora e ainda deixaram-nos presentes? Mantimentos e um monumento curioso. Não, não é confiável. Mas aquele sentimento falou mais alto. Não, não a vaidade, a ostentação exagerada dos próprios defeitos mascarados. Foi aquela mardita dinovo! Aquela fia duma quenga qui mora aqui nesse negoço que os homi chamam di istomgo.

Há! Peguei-os! A que taxa meus batimentos cardiacos aumentavam naqueles instantes que os observava de trás da churrasqueira, através do vidro da janela? Coitados, reflexão era um conceito com o qual não estavam familiarizados. Pensando bem, coitados, mas não por isso.

Orgulhosa, a sequestradora volta para o covil, indo compartilhar uma refeição com seus familiares. Havia vencido pelo silêncio, como sua mãe gostava de ensinar.




Capítulo IV


Olhos que vigiam os menores movimentos prontos para reagir. Transpiram medo. Transpiram ódio. Anseiam a morte tão ardentemente quando desejam viver. Agarram-se a qualquer coisa que se aproxime. Para rasgá-la, perfurá-la, trucidá-la. Para sentir-se protegidos.

Precisava que eles gostassem de mim como uma deles. Para isso, era preciso primeiro fazer parte do ambiente, ser inofensiva, neutra e depois, felina.



Quem convive com gatos por algum tempo, passa a observá-los. O jeito que eles gostam de deitar, de mostrar a barriga quando estão dispostos a fazer amizades, de olhar nos olhos e miar manso para fazer pedidos. De descansar na grama. De brincar com chutes e de enterrar suas fezes. Quem convive com gatos por algum tempo, passa a imitar suas maneiras. É. Não, é sério. Não, minha mãe não age como um gato. Sim, eu sim, as vezes. O que isso significa?! ... O que está tentando insinuar?

Notei que eles gostavam de Sarrus de uma forma natural. Ele já havia me adotado. Seria possível usar esses laços a meu favor? Mas oito dias critalizavam diferenças notáveis entre eles! Oito dias. Dias.

Deitei-me no chão do "Centro de Reabilitação". Sonhei. Não pergunte com o quê - não lembro. O osso do meu rosto doía quando um barulho deles me acordou. Olhavam para mim. Saí e trouxe ração e aquele pestinha do Sarrus. Confortáveis, com a barriga cheia, que comece a interação! "O segredo é não parecer interessada, eles são curiosos e virão por conta própria", foi o preceito que segui. Brinquei a beça com o pequeno que miava e ronronava mordendo meus dedos. Seus irmãos nos observavam como se fossemos uma roda gigante iluminada. Os sons emitidos por Sarrus os empolgava a desbravar. Ao percebê-lo, fiquei imóvel. Controlei a respiração e permaneci fitando o teto. Sutilmente, um deles cheirou meu ombro esquerdo e me lambeu. Minha felicidade era pura. Como aquela que geralmente segue o primeiro beijo.

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